Entenda a negociação como um PROBLEMA a ser solucionado pelos negociadores e não como uma competição. VEJA COMO NESTE POST!
José Carlos Martins F. de Mello | Valor Agregado Consultores
O que é entender a negociação como um problema a ser solucionado pelos negociadores? É chegar a um acordo através da transparência e da troca de informações em um ambiente de confiança, visando o aumento do valor envolvido no negócio. A negociação com base na solução de problemas busca acordos que atendam a todas as partes por meio da criação de valor ao invés da extração de concessões (utilizando poder) que é a característica do processo de negociação convencional, também chamado de competitivo ou ainda de “queda de braço”.
O QUE É NEGOCIAR DE FORMA COLABORATIVA
“Negociar de forma colaborativa não significa ingenuidade, abrir mão de suas metas e objetivos e muito menos ser “bonzinho”. Significa que os negociadores decidiram alcançar os seus objetivos utilizando um processo (ou uma postura) diferente da negociação competitiva tradicional. Quando os negociadores decidem pela postura colaborativa, significa que estão preocupados em obter ganhos financeiros, mas também estão preocupados em manter ou mesmo fortalecer o relacionamento entre eles. Ao contrário do processo competitivo, a negociação colaborativa deve ser mais transparente, os riscos devem ser compartilhados, a relação de confiança deve maior (apesar de quase nunca ser total) e a informação deve se usada como ferramenta e não como arma. A negociação deve ser vista como uma forma para solucionar problemas e não como uma forma de se extrair vantagens da outra parte.
A negociação colaborativa, ao contrário da forma tradicional competitiva, não envolve barganha de propostas e extração de concessões, sendo muito mais um processo de aprendizado e respeito mútuos. Para que tenha sucesso, é necessário que os todos os negociadores mudem a forma de negociar e tenham atitudes diferentes do modelo convencional. Estas atitudes são:
- a percepção correta dos seus próprios interesses
- a percepção correta dos interesses da outra parte
- a troca de informações legítima
- a construção de uma relação de confiança adequada
- a percepção correta das necessidades da outra parte
Negociar com base em solução de problemas não transforma pessoas agressivas e dominadoras em pessoas cooperativas e também não torna honestas as pessoas desonestas. Entretanto, pode influenciar os negociadores no sentido da cooperação pelo fato de oferecer a possibilidade de criação de valor que pode tornar os truques, os blefes e as jogadas (muito comuns no processo competitivo) menos atraentes do que a colaboração.
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PRINCÍPIOS DO PROCESSO
Grande parte dos negociadores se baseia no princípio de que, em negociação, as necessidades de cada parte são antagônicas, o que leva o relacionamento a ser, necessariamente, antagônico. Antagonismo leva à defesa e uma forma de se defender é não compartilhar informações. Informações não compartilhadas significam pouco ou nenhum conhecimento das necessidades e dos interesses da outra parte e, consequentemente, pouca preocupação com outro lado.
Para negociar de forma colaborativa é necessário quebrar esse paradigma e seguir um roteiro psicológico completamente diferente do processo competitivo. Atitudes defensivas que levam a não compartilhar informações têm necessariamente de serem deixadas de lado e o processo deve ocorrer dentro de um ambiente de empatia, harmonia e confiança o que leva à troca de informações em nível elevado e sincero.
Assim, a negociação pode ser vista como uma forma de solucionar um problema e não como uma queda de braço. Isto não é muito difícil de ser entendido e vamos usar uma negociação comercial como exemplo. Em um processo de compra ou de venda, os negociadores, quase sempre, se veem como opositores e consideram que os interesses de cada parte são antagônicos, mas essa é uma visão apenas parcial. É verdade que compradores e vendedores têm interesses divergentes com relação a uma variável muito importante que é o preço e assim é natural que o comprador deseje pagar um valor baixo enquanto o vendedor quer receber um valor mais alto. Mas o que dizer das outras variáveis? Elas podem ou não serem divergentes e um ponto fundamental não é antagônico: o comprador deseja comprar enquanto o vendedor deseja vender, desde que as condições do negócio sejam aceitáveis para ambos. Além disso, outras variáveis podem ser totalmente convergentes como especificações e prazos de entrega, por exemplo.
A postura de negociação com base em solução de problemas parte de um princípio fundamental: os negociadores desejam o acordo desde que as condições sejam aceitáveis para todos. Assim, eles trocam informações sobre as suas necessidades, seus desejos e limitações procurando compreender o outro lado até que um acordo seja alcançado. Existem concessões de ambas as partes, mas elas são negociadas e não extraídas como acontece no processo competitivo. Assim a extração de concessões é uma prática que deve ser evitada, da mesma forma que barganha, ofertas e contra-ofertas. Extração de concessões, blefes, ofertas e contra-ofertas constituem parte integrante da batalha do sistema competitivo e não devem ser utilizadas no processo cooperativo sob pena de torná-lo competitivo.
SISTEMATIZAÇÃO DO PROCESSO
Visando sistematizar o processo, Albrecht e Albrecht (1995) apresentam 5 etapas a serem seguidas dentro de um processo de negociação com base em solução de problemas. Estas etapas seguem uma sequência lógica, iniciando com a troca de informações sobre as necessidades de cada parte e chegando a um quadro mais específico à medida que os negociadores preparam, analisam e escolhem entre diversos pacotes de negócio. As etapas são:
(1) esclarecer interesses
(2) identificar opções
(3) criar pacotes de negócio (etapa opcional)
(4) escolher o melhor negócio (também opcional)
(5) fechar e aperfeiçoar o negócio.
Em negociações não muito complexas são necessárias somente as etapas (1), (2) e (5) que serão descritas a seguir.
ETAPA 1: ESCLARECER OS INTERESSES
Nesta etapa os negociadores procuram descobrir os reais interesses de cada parte e assim a comunicação entre eles é um fator crítico. Quanto mais os negociadores trocarem informações sobre as questões pertinentes ao negócio, maior será a probabilidade de alcançarem um acordo capaz de satisfazer as suas necessidades. Para descobrir os interesses, existem algumas perguntas:
- quais problemas o outro lado estaria procurando resolver com a negociação?
- por que o outro lado está negociando com você?
- quais os problemas você está tentando resolver?
Albrecht e Albrecht (1995) sugerem:
“Mesmo que o outro fique tentando esconder o jogo e não ofereça muitas informações, faça suposições sobre as necessidades e os interesses da outra parte. Apesar de ser mais fácil negociar com pessoas que informam o que desejam, se você tirar algumas conclusões com base nas informações que você puder reunir ou interpretar, será possível descobrir alternativas de negócio para oferecer ao outro negociador.”
É conveniente separar os interesses em duas categorias distintas: os qualitativos e os quantitativos. Os interesses qualitativos estão relacionados com fatores intangíveis, pessoais e baseados na percepção. Entre os interesses qualitativos um deles é fundamental: a qualidade desejada do relacionamento em longo prazo com a outra parte.
Os interesses quantitativos são mensuráveis e se relacionam com o que é tangível. No dia a dia do negociador, exemplos de interesses quantitativos são preços, prazos e condições de pagamento.
ETAPA 2: IDENTIFICAR OPÇÕES
As negociações podem envolver diversos elementos de valor que têm importâncias relativas diferentes para cada parte. Faça um levantamento dos elementos de valor disponíveis no negócio. Faça a si mesmo perguntas do tipo:
- quais são os elementos de valor qualitativos e quantitativos?
- o que posso oferecer que eles estejam necessitando?
- o que eles podem me oferecer que vá ao encontro das minhas necessidades?
- de que modo poderemos atuar em conjunto para aumentar o valor ao negócio?
- o que é pouco importante para mim, mas é muito importante para eles e vice-versa?
Em um processo de compra e venda convencional se gasta muito tempo discutindo a variável preço, mas será que ela é sempre a mais importante? A resposta pode ser não e os exemplos são inúmeros: um comprador que precisa com urgência de uma peça para reparar um equipamento que está parado na sua indústria está mais preocupado com prazo de entrega do que com preço. Um comprador que está sem caixa no momento e precisa comprar para entrega imediata está mais preocupado com o prazo para pagamento do que com o preço. Além disso, as importâncias relativas dos itens para cada negociador podem ser diferentes.
No processo de negociação competitiva o nível de troca de informações entre os negociadores é normalmente baixo devido à desconfiança que está quase sempre presente. Assim, muitas vezes, as verdadeiras necessidades de cada parte não são descobertas e a qualidade do acordo é, muitas vezes, baixa. A identificação das opções através da troca de informações legítima e transparente permite que cada parte conheça e entenda o problema do outro e as soluções mais eficazes podem aparecer. Veja o exemplo a seguir.
Uma indústria está sem produzir porque um equipamento vital está parado aguardando a compra de uma peça em regime de emergência. O comprador corporativo (que conhece as condições dos fornecedores em termos de preços e prazos) foi encarregado de efetuar a compra. No processo competitivo convencional, ele convidaria os fornecedores a apresentar uma cotação sem informá-los da urgência, receando que os fornecedores se aproveitassem da situação para elevar preços. Suponhamos ainda que, devido ao prazo “apertado”, somente um fornecedor se apresenta, mas com um preço muito maior do que o normalmente praticado. O comprador imagina que o fornecedor tomou conhecimento da situação de emergência e aumentou o preço, se aproveitando da situação. Como não tem opção efetua a compra prometendo a si mesmo “dar o troco” naquele fornecedor na primeira oportunidade que tiver. Essa é uma situação que pode ocorrer todos os dias nas empresas.
Vejamos agora o que pode estar acontecendo do lado do fornecedor. Suponhamos que, para atender ao prazo urgente demandado pelo cliente, foi necessário pagar um frete muito mais alto que o usual e, na verdade, o preço pedido (mais alto) foi suficiente somente para compensar o frete maior. Suponhamos ainda, que a empresa compradora pudesse contratar o frete em condições mais favoráveis. Nesse caso, a troca de informações em níveis mais elevados permitiria que cada parte tomasse conhecimento dos problemas da outra parte e um acordo mais eficaz seria alcançado. Além disso, o relacionamento entre as empresas não ficaria prejudicado.
Vejamos os interesses das duas partes:
(1) o comprador deseja entrega urgente e o vendedor pode atender
(2) o comprador quer ser bem atendido e o vendedor deseja atender bem
Estes dois interesses não são antagônicos.
(3) o comprador deseja pagar um preço compatível com o mercado e o vendedor deseja algum lucro.
Esse último item pode ser antagônico ou não, mas poderia ser resolvido incluindo nas discussões um novo fato, que, no exemplo, é o frete por conta do comprador. Este exemplo mostra que o nível elevado de troca de informações pode levar a soluções diferentes com ganhos para todos os lados.
ETAPA 3: FECHAR E APERFEIÇOAR O NEGÓCIO
As pessoas têm tendência de querer apressar as coisas quando alcançam este estágio do processo. Porém este passo deve ser considerado como uma oportunidade que os negociadores têm de assegurar-se de que se conseguiu examinar todos os pontos importantes, que o relacionamento ainda está sadio e que existe um contrato escrito com o qual todas as partes concordam.
Muitas pessoas descobrem, para grande alívio delas, que percorrer as etapas não é difícil nem cansativo, especialmente quando comparado com o típico cabo de guerra que caracteriza a negociação competitiva. Além disso, a utilização do processo de negociação cooperativa leva, quase sempre, a acordos mais eficazes que criam valor e contribui para um relacionamento mais saudável entre os negociadores facilitando as negociações futuras e a implementação das medidas acertadas durante a negociação.
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BIBLIOGRAFIA
1. Albrecht, K.; Albrecht, S. Agregando valor à negociação. São Paulo: Makron Books, 1995.
2. Mello, J.C.M.F. Negociação baseada em estratégia. 3ª Ed. São Paulo: Atlas, 201